Leibniz 5.8.1 A curva de eficiência de Pareto

Para entender melhor os suplementos Leibniz, veja por favor a “Introdução aos Leibniz”.

Existem muitas alocações possíveis resultantes da interação entre Ângela e Bruno. Por exemplo, analisamos a alocação que Bruno iria impor se pudesse usar a força, e a alocação que ele escolhe quando pode oferecer um contrato “pegar ou largar” no qual Ângela pode trabalhar na terra se lhe pagar renda em forma de parte do cereal produzido. Neste Leibniz, vamos definir matematicamente o conjunto de alocações Pareto eficientes: isto é, a curva de eficiência de Pareto.

eficiente de Pareto
Alocação com a propriedade de que não há uma alocação alternativa tecnicamente factível em que pelo menos uma pessoa estaria melhor e ninguém estaria pior.

Uma alocação factível é eficiente de Pareto se não há alocação que a domine no sentido de Pareto: ou seja, ninguém pode melhorar sem que alguém piore. Logo, para encontrar uma alocação eficiente de Pareto entre Bruno e Ângela, começamos pensando a respeito de suas preferências — ou seja, sobre o que melhora a situação de cada um deles.

Ângela valoriza o tempo livre e o cereal que consome. Ela tem uma função de utilidade quasilinear e, como vimos no Leibniz 5.4.1, a escrevemos da seguinte forma:

onde são suas horas diárias de tempo livre, é o número de alqueires de cereal que ela consome por dia, e a função é crescente e côncava.

As preferências de Bruno são muito simples. Ele se interessa apenas pela quantidade de grãos que recebe, que será chamada de . Quanto maior , melhor Bruno está.

O conjunto economicamente factível

A seguir, encontramos quais alocações são economicamente factíveis. A quantidade total de cereal disponível para Ângela e Bruno é a quantidade que Ângela produz ao utilizar parte do seu tempo para cultivar a terra. Como no Leibniz 5.4.1, suponha que Ângela produz alqueires de cereal quando tem horas de tempo livre por dia. Assumimos novamente que seja uma função decrescente e côncava: e .

é a quantidade máxima de cereal que Bruno e Ângela podem consumir entre si, então a fronteira de possibilidades de sua interação é:

Suponha que, se Ângela não trabalhasse e recebesse alimentação de subsistência do governo, seu nível de utilidade seria . Ela só estará disposta a trabalhar se estiver pelo menos tão bem quanto a não trabalhar. Sua curva de indiferença de reserva é:

Bruno não terá interesse na interação a menos que a quantidade de grãos que receberá seja pelo menos zero: . (Uma quantidade negativa de grãos significaria dar cereal adicional a Ângela, retirando-o de seu próprio estoque.)

O conjunto economicamente factível é o conjunto de alocações com cereal de Ângela, , cereal de Bruno, , e tempo livre de Ângela, , tais que:

Essas são as alocações nas quais a quantidade total de cereal consumida é menor ou igual à quantidade produzida, e em que tanto Ângela quanto Bruno recebem pelo menos sua utilidade de reserva.

A condição de primeira ordem para alocações eficientes de Pareto

Uma forma de descobrir as alocações eficientes de Pareto da interação entre Ângela e Bruno é raciocinar da seguinte forma: “suponha que tomemos uma alocação na qual Bruno recebe uma quantidade de cereal. Assim, a alocação só é eficiente de Pareto se Ângela estiver tão bem quanto possível dada a quantidade de cereal de Bruno, e a utilidade dela for pelo menos .”

Isso significa, primeiramente, que em uma alocação Pareto eficiente, todo o cereal produzido deve ser consumido. Logo, se a quantidade de cereal produzida é , e Bruno consome , Ângela deve consumir todo o restante: . Não há cereal sobrando por aí.

Em segundo lugar, sujeitos à restrição de que todo o cereal seja consumido, e devem, juntos, maximizar a utilidade de Ângela. Em outras palavras, dado , uma alocação só pode ser eficiente de Pareto se:

contanto que a alocação proporcione a Ângela sua utilidade de reserva. Este problema de otimização com restrição pode ser resolvido utilizando a restrição para substituir . Uma vez que , tudo o que precisamos fazer é:

Em seguida, ao diferenciar em relação a e igualar a derivada a zero temos a condição de primeira ordem:

Vimos esta equação antes, no Leibniz 5.4.2, no qual destacamos que a hipótese de que e sejam funções côncavas implica que o problema tem, no máximo, uma solução. Assumimos que esta solução existe e a denotamos por .

Observe que o problema de otimização com restrição que resolvemos é aquele que Ângela resolveria se pudesse escolher e por si mesma e Bruno exigisse uma quantidade de cereal pelo uso da terra. A condição de primeira ordem é a conhecida equação , onde e . No Leibniz 5.4.2, resolvemos o problema para o caso em que Ângela era uma agricultora independente: . Demonstramos que, nesse caso, a escolha de seria a mesma qualquer que fosse a quantidade de cereal exigida por Bruno.

Traçando a curva de eficiência de Pareto

Mostramos que, dado o consumo de cereal de Bruno, , existe apenas uma alocação eficiente de Pareto: sendo o tempo livre de Ângela, a solução para a condição de primeira ordem:

e o consumo de cereal de Ângela é . Para encontrar esta alocação, começamos fixando arbitrariamente. Na verdade, existem infinitos valores factíveis de , e para cada um, existe uma alocação eficiente de Pareto correspondente.

O conjunto de todas as alocações eficientes de Pareto — ou seja, a curva de eficiência de Pareto — é o conjunto de todos os pontos que satisfazem a condição de primeira ordem e todas as restrições que determinam o conjunto economicamente factível. Então, o conjunto é determinado pelas condições:

No exemplo que vimos na Figura 5.8 do texto, reproduzida aqui como Figura 1, tem-se que . As alocações eficientes de Pareto estão na reta vertical , e a quantidade de cereal produzida é alqueires. Os pontos nesta linha vertical são aqueles em que a TMS de Ângela entre tempo livre e cereal é igual à TMT. Porém, nem todos os pontos da reta satisfazem as outras restrições. O conjunto de todas as alocações eficientes de Pareto está entre os pontos C e D. Por exemplo, na alocação representada pelo ponto G, Bruno obtém uma quantidade de cereal representada por GC, e Ângela obtém o restante.

Tela inteira

Figura 1 Alocações Pareto eficientes e distribuição de excedentes.

As alocações com mais alto e mais baixo são mais próximas de D: beneficiam mais a Bruno e menos a Ângela. As alocações próximas de C são melhores para Ângela e piores para Bruno.

A conclusão de que o tempo livre de Ângela é o mesmo em todas as alocações eficientes de Pareto é consequência de sua função de utilidade ser quasilinear, e não seria válida para formas alternativas da função . Em outros casos, a curva de eficiência de Pareto estaria dentro da região em formato de lente na Figura 1, mas não seria uma linha reta vertical.

A curva de eficiência de Pareto: dois exemplos

Nosso primeiro exemplo ilustra os princípios das duas seções anteriores utilizando funções de utilidade e de produção específicas. Daremos então um segundo exemplo, no qual a função de utilidade de Ângela não é quasilinear, e a curva de eficiência de Pareto realmente é uma curva, e não uma linha vertical.

1. Funções de utilidade e de produção específicas

Como no Leibniz 5.4.2, assumimos que a fronteira de possibilidades e a função de utilidade de Ângela são dadas por:

Logo, os termos denotados acima por e são, respectivamente:

Assim, , que representa as horas diárias de tempo livre de Ângela em cada alocação eficiente de Pareto, é a solução para a equação:

Essa equação implica que:

Portanto, , e a quantidade de cereal produzida é . Logo, neste exemplo, cada alocação Pareto eficiente deve ser tal que:

Além disso, tanto Ângela quanto Bruno devem receber pelo menos suas utilidades de reserva. A utilidade de reserva de Ângela é atingida quando ela não trabalha e consome alqueires de cereal por dia, fornecidos pelo governo. Assim, sua utilidade de reserva é . Sendo assim, a alocação eficiente de Pareto com , deve satisfazer:

Resolvendo esta desigualdade, temos:

arredondando para três casas decimais. A quantidade de cereal de Bruno deve ser pelo menos zero. O valor máximo possível de é a quantidade que dá a Angela o mínimo possível de cereal. Como , arredondando para três casas decimais, o resultado é . Resumindo, o intervalo possível para Bruno é:

2. Utilidade Cobb-Douglas

Neste exemplo, a função de utilidade de Ângela assume a forma de Cobb-Douglas:

onde . Para que os números funcionem como esperamos, assumimos que . A taxa marginal de substituição (TMS) de Ângela entre tempo livre e consumo de cereal é dada pela fórmula usual (relembre o Leibniz 3.4.1):

Seja a equação de fronteira de possibilidades. Para evitar álgebra complexa, assumimos uma forma de diferente da usada no primeiro exemplo:

Embora o gráfico desta função não seja igual ao da fronteira do exemplo anterior, tem a mesma forma geral e novamente passa pelos pontos e . A taxa marginal de transformação entre o tempo livre e a produção de cereal de Ângela é, como sempre, o valor absoluto da inclinação da fronteira de possibilidades (inclinada para baixo):

Como Bruno exige , de cereal, para a alocação ser eficiente de Pareto, a alocação requer que

A condição de maximização de primeira ordem, , implica que . Rearranjando,

Os pontos no quadrante positivo do plano que satisfazem esta condição formam um arco parabólico inclinado para cima. A curva de eficiência de Pareto é a parte desta curva que contém as alocações economicamente factíveis.

Na alocação eficiente de Pareto minimamente aceitável para Bruno, ele não recebe nada e Ângela consome todo o cereal produzido. Logo, nesta alocação,

Substituindo a primeira equação na segunda e multiplicando por , vemos que . Portanto:

Segue-se que e : a alocação eficiente de Pareto na qual Bruno não recebe cereal (ou seja, Ângela não paga para cultivar a terra) é a mesma do exemplo anterior. (Escolhemos os números exatos para que isso acontecesse).

Agora vamos encontrar a alocação eficiente de Pareto minimamente aceitável para Ângela. Assim como no exemplo anterior, ela pode obter sua utilidade de reserva se não trabalhar, consumindo alqueires de cereal por dia. Logo, na alocação Pareto eficiente em que Ângela também obtém sua utilidade de reserva,

Substituindo a primeira equação na segunda, . Portanto:

Uma vez que , então . Portanto, arredondando tudo para três casas:

A renda recebida por Bruno é . Como Ângela obtém sua utilidade de reserva, este é o máximo pagamento ao qual ela estaria disposta a trabalhar na terra de Bruno.

Em resumo: neste caso, a função de utilidade de Ângela não é quasilinear. Suas horas de tempo livre e, portanto, suas horas de trabalho, não são constantes ao longo das alocações eficientes de Pareto. A curva de eficiência de Pareto no plano não é uma reta vertical, mas é o arco positivamente inclinado da parábola , que corresponde às alocações economicamente factíveis. Essas vão do ponto , no qual Ângela obtém sua utilidade de reserva e Bruno sua renda máxima de alqueires por dia; até o ponto , no qual Ângela consome todo o cereal que produz e Bruno não recebe nada.

Para ter certeza de que entendeu completamente este exemplo, tente desenhar a curva e compare-a com aquela do caso quasilinear.